Como já
dissemos, a partir do Decreto-Lei de
educação comum de 24 de agosto de 1877 (início da Reforma Vareliana), impõe-se
no Uruguai a educação laica, com a excepcionalidade do Artigo 18 da mencionada
lei que estabelece a educação católica como optativa: “La enseñanza de la
Religión Católica es obligatoria en las escuelas del Estado, exceptuándose á
los alumnos que profesen otras religiones, y cuyos padres, tutores ó encargados
se opongan á que la reciban.” (Decreto-Ley de Educación
Común, apud Araujo, 1911:677).
Mesmo
assim, esta educação
religiosa, paradoxalmente obrigatória pois aplicada somente para aqueles que
quiserem recebê-la, será reduzida ao mínimo. Tal como o estabelece Bralich
(1996) com relação aos programas escolares emergentes da reforma Vareliana:
Otro aspecto de los nuevos programas escolares es el referido al
cuestionado tema de la enseñanza religiosa. Aquí, si bien la Ley establecía su
obligatoriedad, Varela y su equipo fijaron un tiempo mínimo para la asignatura
´Moral y Religión´: un 4% del horario escolar, lo que equivalía a 15 minutos
diarios. Esa limitación provocaría más adelante la protesta ante el gobierno
por parte de las mujeres católicas…(Bralich, 1996:68).
Já a partir de 1909, sob a égide
do batllismo, a educação católica - ou a referência a qualquer outra
denominação religiosa - passa diretamente a constituir-se em delito:
La ley del 31 de marzo de 1909 estableció: Art. 1°: Desde la
promulgación de la presente ley, queda suprimida toda enseñanza religiosa en
las Escuelas del Estado. Art. 2°: La Dirección General de Instrucción Pública
determinará los casos en que hayan de aplicarse penas a los maestros
transgresores de esta ley. Esta penas serían de suspensión, pudiendo llegarse
hasta la destitución en caso de reincidencias graves y comprobadas. Art.3°: Comuníquese, etc. (Bralich, 1996:126).
É assim que a partir da proibição explícita
do ensino religioso, os textos contendo referências a um Deus católico ou a
outras figuras do panteão desta religião vão progressivamente desaparecendo.
Não somente se trata da erradicação do corpus católico dos textos
escolares de leitura. Também observa-se neles a passagem progressiva para um
Deus cada vez mais abstrato, afastado da sua inclusão em tal ou qual nominação
religiosa.
Se até o ano de 1909 podem encontrar-se nos
textos de leitura algumas referências explícitas para a religião católica,
depois desse ano - ano da proibição do ensino religioso nas escolas - a menção
a Deus nas escolas é esporádica e, sem dúvida, fora de qualquer identificação
com tal ou qual nominação. Com exceção
relativa neste ponto dos livros de leitura elaborados por José H. Figueira
(1900ª,1900b,1902,1904) que, como
veremos adiante, foram utilizados nos estabelecimentos educativos ao mesmo
tempo que outros textos de leitura, o desaparecimento de representações
fincadas no catolicismo foi, na escola pública uruguaia, um fato, como também o
mostram outros textos de leitura utilizados no mesmo período (por exemplo: os
textos de Vásquez Acevedo 1888, 1889a., 1889b, 1929 e Emma Catalá de
Princivalle 1907, 1908a, 1908b) nos quais não haverá sinal de catolicismo algum
e raríssimas referências a Deus.
Por outro lado, a menção a qualquer nominação
religiosa estará expressamente proibida nas escolas, como dissemos, a partir da
Lei de 31 de março de 1909. Se, como apontava Bralich (1996), o tempo de aula
dedicado à educação da religião de Estado (catolicismo) era, a partir da
reforma escolar (1877) de 15 minutos diários (Bralich, 1996:68) e que, de igual
modo, ficava a encargo dos pais, tutores ou encarregados das crianças, a
assistência ao ensino do catolicismo - Art. 18 da lei de 24 de agosto de 1877 (Bralich 1996:126) - desde 1909 o tempo dedicado à ainda religião de Estado
(não esqueçamos que a separação entre Igreja Católica e Estado Uruguaio data de
1917), será nulo.
Desta forma, o progressivo desaparecimento do
panteão católico da escola pública determinou que as conjunções entre a
história da nação - com alguns matizes - ficasse à salvo de se transformar em
uma história protegida por um Deus claramente identificado com alguma nominação
religiosa.
6.1 Transformações, continuidades e descontinuidades nos
textos de leitura
Graças a Jacobo A. Varela - irmão de José
Pedro Varela e seu sucessor no posto de Inspetor Nacional da Instrução Primária -
possuímos a aprimorada compilação intitulada “Memória correspondente aos anos
1879 e 1880 apresentada à Direção da Instrução Pública” (Varela, 1881a).
Destas memórias pode-se concluir que o
primeiro livro de leitura utilizado nas escolas públicas uruguaias foi o “Libro
primero para uso de los niños” (Varela, 1881a; 100 e 102) . O
texto mencionado, porém, é de autoria do Dr. Mándevil, e inclui-se numa
trilogia.
Podem apontar-se alguns aspectos da Série de
Mándevil, composta de três níveis. Em primeiro lugar, trata-se de três livros
de leitura “Libro primero para uso de los niños” (1892); “Libro segundo de
lectura” (1887) e “Libro tercero de lectura” (1890). Não se trata de primeiras
edições, embora também não se possa estabelecer com certeza o número e a data
das edições anteriores. Há dois motivos para concluir que os textos que
consultamos são reedições: a já citada obra de Varela (1881a), que inclui sua
utilização já em 1879 e 1880, e os prefácios elogiosos com que estes livros
anunciam as novas tiragens que consultamos.
É importante destacar que os textos de
leitura de Mándevil não são elaborados para o leitor uruguaio em particular.
Trata-se de textos de origem norte-americana, traduzidos e editados para o
espanhol em Barcelona e Paris.
Tal é o caso da edição do já mencionado
“Libro primero”, editado em 1892 em Barcelona, e reimpresso sem mudanças em
1894 pela editora parisiense Livraria Hachette et Cie. em 1894; também o “Libro
segundo”, editado pela francesa Livraria Garnier Frères, no ano de 1887, e do
“Libro tercero”, editado também pela francesa Livraria Hachette et Cie., em
1890.
Os livros de Mándevil, em sua qualidade de
livros não elaborados especificamente para o leitor uruguaio, possuem somente o
caráter “moralizador” para as crianças e, contudo, mostram a ilustração de
algumas figuras constitutivas do panteão católico.
Estes textos permanecem à parte de qualquer
mito-práxis possível da nação por dois razões: em primeiro lugar, por tratar-se
de livros e autores que não escreviam diretamente para o Uruguai, inabilitando
desta maneira as possibilidades da especificidade mitoprática da nação. Por outro lado, o fato de agruparem figuras e textos católicos, não gera, pelo
primeiro motivo esboçado, conjunção mítica nenhuma que amarre o catolicismo à
construção simbólica da nação uruguaia.
Não obstante, cabe estabelecer continuidades
semânticas importantes entre os livros de origem não uruguaia e os posteriores,
já escritos por autores uruguaios ou fincados no Uruguai.
Como já
assinalamos, os textos de leitura - tanto a série de Mándevil como os de
origem nacional - eram zelosamente aprovados para a sua utilização pela
“Dirección General de Instrucción Pública”, máximo órgão da educação primária
no Uruguai.
Apesar da clara vocação anticatólica da
reforma vareliana, e da “Dirección General de Instrucción Pública”, podem
estabelecer-se, como apontávamos, algumas continuidades semânticas entre a
série Mándevil - produzida fora do contexto da reforma - e aqueles livros que
eram escritos sob o calor do reformismo vareliano.
O relatório
apresentado por Orestes Araújo, na época Inspetor das Escolas do
Departamento de San José (interior do Uruguai), a Jacobo Varela sobre a
situação das escolas do mencionado departamento, serve
como exemplo de nexo da continuidade semântica entre os livros escolhidos
(série Mándevil) e aqueles produzidos pelos reformistas varelianos.
Referindo-se ao ensino religiosos, Orestes
Araújo (1881) dirá:
Urge pues, que la enseñanza de la moral ocupe el sitio que va dejando
la del dogma; pero no esa moral preceptiva que se dirige exclusivamente á la
inteligencia del niño, sinó aquella otra que afecta su conciencia y cultiva su
corazón. Tampoco fuera de desear la enseñanza de una moral basada en la
disciplina de determinadas religiones que nunca conseguirán educar las facultades
del alma. (Araujo 1881:215. apud:
Memoria correspondiente a los años de 1879 y 1880. Tomo II. Montevideo,
Imprenta de la Idea, 1881b).
Se em ambos os casos os textos de leitura
pretendem coadjuvar na produção de uma unidade (crente católico ou cidadão
crente na nação laica), possuindo assim neste ponto uma continuidade de
sentido, a descontinuidade tornar-se-á evidente na medida em que a prédica
cidadã ficará ligada aos mitos da nação, enquanto os textos de “moralização”
católica irão desaparecendo, sem deixar rasto nenhum nos mitos da nação laica.
Não existirá, deste modo, a possibilidade de conformar uma “ilha de
sentido” (Segato, 1997) capaz de unificar a imagem do crente de uma
denominação, com os mitos fundacionais e em processo de conformação da nação.
À nação laica corresponde, portanto, um
cidadão “laico”, ou seja, um portador da religião civil da nação.
A religião católica - ou qualquer outra
expressão denominacional - torna-se assim no “o outro”, através de seu
esmorecimento e de sua expulsão do panteão mítico da nação. E, se esta religião
civil, continuando em parte com o corpus católico (tentando ao mesmo tempo
substitui-lo), aposta, no seu fervor “civilizatório” e “disciplinante”; na
transformação da criança “incivilizada”, também possui, por outro lado, um
projeto mais amplo: Outros “não civilizados”, “não disciplinados”, hão de se
tornar matéria prima a partir da qual se constitui a nação. Assim, a figura do
“gaucho” protocidadão, do afro-uruguaio (eterno menor a ser cuidado), ao conveniente
(e supostamente longínquo) desaparecimento do índio, também serão matéria
incompleta, não “disciplinada”, que deverá passar pela crivo da escola para
chegar à egrégia figura cidadã, cristalização da religião civil da nação.
Sem desaparecerem as assimetrias, a
heterogeneidade cultural e religiosa tenderá a essa unidade apresentada como
homogênea do sujeito-cidadão que há de carecer publicamente de atributos e
filiações particulares (dentro das possibilidades, estas ficarão por conta do
privado), excetuando aquelas ligadas a uma unidade expressa na nação.
Esta concepção, claramente expressa por
Orestes Araújo (1881), embora amplamente espalhada sobre o estabelecimento de
uma moral fora do dogma (católico), leva-nos novamente aos avatares da religião
civil em sua prática substituinte. Nas
palavras do historiador Barrán: “Aquel Estado celoso de su poder, y aquella
burguesía liberal y anticlerical, apostaron a la labor `civilizatoria´ de su
escuela más que a la religión católica, monopolizada por un poder rival.”
(Barrán, 1990:89).
“El Siglo”
foi quem disse, em 1874, perante um projeto de criação do primeiro bispado:
`Más que una mitra vale un libro que enseña al niño a ser hombre y al paria a
ser ciudadano…(Barrán, 1990:89).
Assim é que a “moralização”, em 1874,
oferecida pelos textos de leitura de raiz católica (série Mándevil e outros
posteriores), terá sua continuidade através da denominada “disciplinamento” (Barrán, 1990), capaz de formar e conformar
cidadãos “responsáveis”.
A continuidade semântica entre a
“moralização” católica e a “disciplinamento” escolar - presentes ambas em
diferentes séries de textos de leitura - está dada a partir da busca da
produção de uma unidade, de um sujeito
(trate-se já de crentes ou cidadãos), produção que dependerá da estrutura
educativa.
Também aqui, de acordo com Barrán, a escola uruguaia, a partir de 1877,
teria desempenhado o papel de “disciplinar” e “civilizar”, tarefa que em outros
contextos de América Latina teria estado em mãos da Igreja, e teria se
realizado um ou dois séculos antes do que no Uruguai (Barrán, 1990:89).
A descontinuidade semântica,
porém, entre aqueles textos de leitura com presença católica e aqueles
posteriores que vão apagando progressivamente este corpus, tem a ver -
insistamos ainda uma vez - com as possibilidades da mito-práxis.
6.2. Os textos de leitura. Suas transformações
No “Libro primeiro para uso de los niños” de
Mándevil, encontramos uma típica lição das modalidades de “moralização” do
comportamento infantil a partir de um Deus vigilante:
Dos muchachos salieron á jugar en la nieve con un trinco chiquito. Uno
de ellos se llamaba José, y el otro, Pablo. José le dijo á Pablo: Tú no te
atreves á ir sobre aquella laguna con el trinco”. – “Sí, yo me atrevo, pero eso
está mal hecho; porque nuestro padre dice que no debemos hacerlo. Entonces José
se rió y dijo: ¿Qué importa eso? Papá no nos puede ver, porque está trabajando
en la tienda.
¿No era José un mal muchacho?
Si, lo era. Él se olvidó que Dios le veía á todas horas.
Pablo le suplicó que no fuese con el trinco á la laguna, porque el
hielo estaba delgado. Pero José era obstinado, y fue sobre el delgado hielo á
una gran distancia.
Entonces Pablo se volvió a la casa, y leyó en su libro de doctrina: -
El Altísimo en el cielo vé todo lo que hacemos. Dios está en todas partes.
Vosotros no podéis ir á ninguna parte sin que Dios os vea. Si vais á
los lugares más oscuros, el ojo de Dios os ve. Él está siempre cerca de
vosotros. Él oye todas las palabras que
decís. Él sabe todas las palabras antes que salgan de vuestra boca. ¿No es esto
extraño? ¿No es esto muy extraño?
“Si, pero es verdad, porque la
Sagrada Escritura lo dice; y todo lo que la Sagrada Escritura dice es verdad.
La Sagrada Escritura dice que los niños deben obedecer á sus padres. ¿Quiénes
son vuestros padres? Vuestro padre y vuestra madre: ¿no es así?
¿Qué es obedecer?
Obedecer es cumplir con un mandato.
¿Queréis que os diga algo más sobre José y Pablo? Después que Pablo
hubo leído un ratito, oyó ruído fuera de la casa. Era la voz de José.
Pablo se asustó, y corrió afuera, y allí vió á José en el agua.
El hielo se había roto, y José estaba hundido en la laguna hasta el
cuello. El pobre muchacho gritaba para que alguien fuese á sacarle. Pablo tomó
un palo largo, le cogió por una punta, y José se agarró de la otra punta, y
salió fuera arrastrándose. Su madre estaba muy pesarosa. Ella temía que José se
pusiese malo; y él estuvo malo mucho tiempo. Pero había otra cosa que la ponía
aún más pesarosa: lo malo que él era. (Mándevil,1892:45).
Também a lição 47 do mesmo livro opera nos
mesmos termos de moralização das crianças, agora através de preces:
Ahora, mis queridos niños, os voy á enseñar una oración para que digáis
todas las noches antes de acostaros.
Señor, en tus manos pongo mi alma: presérvame del pecado, y de una
muerte imprevista.
¿Queréis decirme por qué me acuesto en la cama todas las noches?
Seguramente V. se acuesta en la cama para dormir.
¿No ponéis vuestra alma en las manos del Señor?
Si pero de qué le pedimos al Señor que nos preserve?”
“Niños he aquí otra oración que
debéis decir tanto por la mañana como por la noche.
En el nombre del Padre y del Hijo y del Espíritu Santo. Amén.
Padre nuestro, que estás en los Cielos,santificado sea tu nombre, venga
á nos tu Reino, hágase tu voluntad, asì en la tierra como en el cielo. El pan
nuestro de cada día dánoslo hot, y perdónanos nuestras deudas así como nosotros
perdonamos a nuestros deudores, y no nos dejes caer en la tentación; más
líbranos del mal. Amén. (Mándevil, 1892: 81 e 82)
O
“Libro tercero de lectura”, também de Mándevil (1890), abre-se com uma
lição de um curioso corte antropocêntrico, baseado no homem como centro de toda
criação divina:
Lección 1.
1. El hombre debe alegrarse de la predilección con que Dios le honra,
distinguiéndose tan ventajosamente entre todas las criaturas de la tierra.
2. La naturaleza entera obra y trabaja para el hombre, en la tierra, en
el aire y en las aguas: para él está la oveja cubierta de lana; para él el pie
de caballo se halla armado de aquel caso que no necesitaría, si no debiese
llevar grandes cargas y trepar por las montañas; para él el gusano de seda hila
tan artificiosamente su capullo, se encierra en él y luego lo abandona, para él
va la abeja de flor en flor recogiendo en su caliza esa miel tan regalada; para
el está el buey uncido á su carreta, pidiendo sólo un mezquino alimento, en
premio de sus grandes servicios; para él en fin los bosques, los campos y los
jardines están llenos de preciosidades, cuya mayor parte se perderían, si no
las usáremos nosotros.
3. Es verdad que el hombre tiene incomparablemente más necesidades que
el bruto; pero tiene también más facultades, talento é industria para hacer
concurrir todo lo que rodea á su utilidad, á sus placeres, á la satisfacción de
estas mismas necesidades. Millares de criaturas contribuyen á darle alimento y
vestido y le proporcionan comodidades y recreos; de modo que parece que Dios le
ha dado tantas necesidades, para ofrecerle más grande variedad de agradable
sensaciones.
4. Sería imposible satisfacer necesidades tan multiplicadas, si
tuviesen los animales tantas como nosotros, y á fin de que nada nos faltase y
tuviésemos abundancia de todo, dispuso el Señor, que las cosas de que ellos
necesitan, fuesen ordinariamente las que para nada nos servirán. Para que no
hubiese ni una sola planta que no fuese útil á la conservación de la vida, y
para que la distancia ó aspereza del terreno en que crecen algunas no sirviese
de obstáculo para disfrutar de ellas, el Autor de la naturaleza ha criado
animales que fuesen á buscarlas y nos las trajesen cambiadas en los más
saludables alimentos.
5. En toda conducta de la Providencia con respecto al hombre, brilla
una bondad muy digna de admiración…
(…)
8. Pero no es sólo á la subsistencia del hombre á la que Dios ha
provisto con tanta bondad; sino que se ha dignado además procurarle otros mil
placeres.
Para él canta la alondra y el risueñor; las flores perfuman la
atmósfera, y los campos y jardines están esmaltados con sus colores.
Al hombre le dio sobre todo la razón, para que hiciese contribuir todas
las cosas á sus goces; para dominar á todos los animales, vencer la ballena y
sujetar al león; y lo que es más precioso todavía, para complacerse en las
obras del Altísimo, contemplar su hermosura, su grandeza y su magnificencia y
admirar su órden, su armonía y su maravilloso encadenamiento.
9. Mortal privilegiado y colmado de tantas gracias, cómo podrás pagar á
tu divino bienhechor un digno tributo de agradecimiento? ¿De qué modo
corrresponderás al amor que Dios te manifiesta? Para avivar más y más tu
reconocimiento y tu amor, medita con frecuencia la liberalidad sin límites del
Padre Común, la predilección con que te honra y los bienes innumerables que
continuamente te dispensa.
Considera que no hay sobre la tierra criatura alguna tan favorecida
como tú, echa una mirada á todo lo que te rodea, y contempla el espectáculo de
la naturaleza; pregunta al cielo, á la tierra, al mar y á cuantos séres existen
en ellos, y todos te contestarán á una voz, que tú eres el objeto querido, á
quienes todos los demás deben servir y á quien se refiere aquí bajo toda la
economía de la creación, al paso que el autor de este universo es para ti mismo
tu verdadero fin. (Mándevil, 1890:5-9).
Evidentemente, esta construção antropocêntrica que depende de uma divindade será suprida,
entre outras vicissitudes da religião civil, por louvações ao progresso
No mesmo livro citado, é apontada também a
presença, embora rara, de cânticos que fazem referência à figura de
Maria:
Lección 17.
Ave María
Oh, Madre del Redentor,
Puro sol de nuestro día,
Refugio del pecador,
De los perdonados guia,
Ave María!
Oh Vírgen de gracia llena,
Luz de la sabiduría,
Cuyo dulce nombre suena
Con tan célica armonía,
Ave María!
Radiante estrella del mar,
Que en nuestra noche sombría,
Nos puedes sola llevar
De salvación á la via,
Ave Maria.
Cuando , ‘Bendita tú eres,’
EL arcángel te decía,
‘Entre todas las mujeres;
El Señor á ti me envía,
Ave María’.
Tu alma inocente y pura,
Sin duda, oh Virgen, sentía,
Una inefable dulzura
Que casi espirar te hacia,
Ave María.
Pues bien, Señora, yo sé,
Mi alma en ello confía,
Que cuando llena de fe,
Te dice la mente mía,
Ave María.
(Mándevil,1890: 67-68)
Também neste
livro de Mándevil, a figura do pecador perante a morte, vai igualmente
no sentido da moralização das atitudes frente a Deus:
Lección 20.
Retrato de un pecador en agonía.
De esta manera todo se muda para este desdichado, y estas mudanzas con
sus sorpresas y sus separaciones forman la última amargura del espectáculo de
la muerte…
Este futuro, esta región de tinieblas donde va á entrar sólo, sin más
compañía que la de sus conciencia; este futuro, esta tierra desconocida de
donde no vuelve ningún mortal, y donde no sabe lo que le espera; este futuro,
este abismo inmenso donde su alma pierde y se confunde, y donde va á
sepulcrarse incierto de su destino; este futuro, este sepulcro, esta mansión de
horror donde va á ocupar un lugar entre las cenizas y los cadáveres de sus
abuelos; este futuro, esta admirable eternidad, cuya perspectiva le es
insoportable; este futuro, en fin, este juicio temible donde va á comparecer
ante la cólera de Dios, y á dar cuenta de una vida, cuyos momentos casi todos
han sido otros tantos crímenes…
Ay! Mientras que veía de léjos este futuro terrible, se vanagloriaba
horriblemente de no temerlo, y no cesaba de preguntar con un tono blasfemo é
irrisorio, quién ha vuelto de allá?
Burlábase de los temores vulgares, y se jactaba de su firmeza y su
valor. Pero desde que lo señala el dedo de Dios, desde que se le presenta la
muerte abriéndole las puertas de la eternidad, y desde que toca este futuro
terrible, contra el que tan seguro había parecido…ay! desde entónces, ó lo
vemos débil, trémulo, lloroso y levantando sus manos suplicantes al cielo, ó
melancólico, taciturno, y agitado por los más horrorosos pensamientos, y sin
esperar de parte de Dios más recursos de la flojedad de sus lamentaciones y de
sus lágrimas, que de sus furores y de su desesperación. (Mándevil,
1890: 77-81).
Nas lições da série de Mándevil, o Deus
apresentado é um Deus a quem se deve amar e
obedecer. Também são veiculadas instâncias diversas de moralização do escolar:
Mas, nas “Lecturas ejemplares”
de Orestes Araújo - livro em que
aparece o conhecido poema “La Leyenda Patria” de Juan Zorrilla de San Martín,
pedra fundamental no mito fundacional da nação até os nossos días -
aparece a conjunção de um Deus carente de qualquer nominação com a própria
Nação. Este Deus que, como já dissemos, não é um Deus vinculado explicitamente
a qualquer nominação religiosa, está presente em alguns parágrafos da saga da
independência do Uruguai:
La leyenda patria.
(…)
La voz de Dios…Clavado en la llanura,
Del nuevo Sinaí sobre la espalda,
Como león que sacude la melena,
Azota el aire y estremece el asta
El pabellón de Libertad o Muerte
Que el aura agita de presagios llena.
Vibrando está en los labios
El santo juramento
De muerte ó libertad, firme, grandioso,
Que da á los hombres de virtud ejemplo,
Y se esparce solemne y poderoso,
Cual se difunde el salmo religioso
Por las desiertas bóvedas del templo
(…)
En tus vastas laderas
Deja que se dilate el pensamiento
Y respire el aliento
De aquellas auras de tu honor primeras,
Auras de libertad que en su regazo
Hasta Dios condujeron,
El sello á recibir de eterna vida,
Con las almas de bravos que cayeron,
El alma de la patria redimida.
Los himnos de tu aurora
Deja que el labio vibre:
¡Paso al pueblo novel! ¡Sonó su hora!
Que quien sabe morir, sabe ser libre.
(…)
Empapadas en luz y en armonías,
De aquel campo divino
Las auras nuestro Plata atravezaron…(Orestes Araújo, 1894: 243-249)
O poema “La leyenda patria”, representação
emblemática da gênese da nação uruguaia, é recitado hoje em dia em todas as escolas uruguaias. A divindade
aqui reside mais no fato sagrado da luta pela independência, gesta que, no
fervor do poeta, pode ser comparada com alguns trechos bíblicos.
Nos textos de José H. Figueira (1900a, 1900b,
1902, 1904), voltamos a encontrar, de forma similar à série de Mándevil, todo
um exercício de obediência a Deus, às autoridades instituídas, aos pais.
Novamente opera aqui a moralização da
criança.
Todavia, corresponde fazer um esclarecimento:
se a série de Mándevil foi aceita pelos reformistas varelianos, foi em seu
caráter provisório, até a produção de livros por parte de autores uruguaios ou
fincados no Uruguai. De fato, a partir de 1892, por resolução da
“Dirección de Instrucción Pública”
(Bralich, 1990:15), os livros de leitura produzidos por Vásquez Acevedo e
outros autores uruguaios serão de uso exclusivo nas escolas (Bralich, 1990:15).
Embora não se trate de uma prática
substitutória imediata (há edições utilizadas de Mándevil até pelo menos 1894)
- o certo é que o deslocamento destes textos não produzidos no Uruguai irá num
aumento progressivo.
Também os textos de José H. Figueira (1900a,
1900b, 1902, 1904) - que coincidem em seu uso - entre outros - com os de
Vásquez Acevedo e outros autores uruguaios ou fincados no Uruguai - serão
utilizados com exclusividade pela escola primária. Possuirão então, um caráter
oficial e, sobretudo, deslocarão os textos de leitura produzidos no estrangeiro
(particularmente a série Mándevil).
Os textos de leitura escritos por Figueira
(1900a, 1900b, 1902, 1904) conformam uma das passagens onde ainda se insiste na
“moralização” católica, aparecendo também figuras católicas, ao mesmo tempo em
que surgem passagens próprias da religião civil em processo de constituição.
No livro de Figueira “¿Quieres leer?” nas
páginas 95 e 102 lemos:
¡DIOS MÍO! A TI ELEVO MI RUEGO,
UNA Y MIL VECES, PARA DARTE LAS GRACIAS POR LOS BIENES QUE ME CONCEDES:
CONSÉRVAME LA SALUD DEL ALMA Y DEL CUERPO Y GUÍAME POR LA SENDA DEL SABER Y LA
VIRTUD. (Figueira, 1900a. :95).
As indicações para o professor que aparecem
logo após este texto são as seguintes:
Al maestro:
explicación de palabras: oración, desamparar, conceder, senda, virtud. Trátese
que los alumnos observen que toda la lección anterior va impresa con letra
mayúscula. Este carácter de impresión suele emplearse á veces para llamar la
atención del lector hacia el asunto que se trata. (Id.Ibid.).
Também no mesmo livro, na página
102, aparece a seguinte prece:
Ruego.
Dios mío, aunque soy una niña, nunca me olvido de ti.
Te ruego me ayudes á ser buena, para que mis padres, hermanos y
maestros estén siempre contentos de mi conducta (Figueira,1900a:102).
O livro “¡Adelante!”, do mesmo
autor, inicia com a imagem da Virgem e o menino, e com chamados à obediência:
Lección 64.
La plegaria del niño.
Da, ¡oh Dios! á las fuentes
agua;
plumas á los pajarillos,
al tierno cordero lana,
y al prado, sombra y rocío.
Da la salud al enfermo;
pan al mísero mendigo;
al triste huérfano albergue
y libertad al cautivo.,
Haz que mis padres y hermanos,
que siempre te son sumisos,
tengan salud y fortuna,
y se contenten conmigo.
(Figueira,1904:167).
Na lição 81, chamada “Consejos”, deparamos
com as seguintes indicações:
1. Sé bueno y amable.
(…)
Ama mucho a tus padres. Nunca les des el más leve motivo de disgusto.
(…)
12. Respeta y quiere mucho á
tus maestros; pues á ellos les deberás gran parte de tu felicidad.
Trata á todo el mundo con respeto: á los pobres como á los ricos, á los
blancos como a los negros.
(…)
15.Ama a tu patria y haz lo posible por su prosperidad.
16. Piensa á menudo en Dios, trabaja y pórtate bien: así merecerás su
protección.
17. AYÚDATE, Y DIOS TE AYUDARÁ.
Al maestro: Estos preceptos morales deben ser explicados á los alumnos,
de manera que comprendan su principal importancia. Después, se les ejercitará
en aprenderlos de memoria. (Figueira, 1904: 188).
O livro “¡Adelante!” fecha com a lição 82 da
seguinte maneira:
Ruego.
SEÑOR: GRACIAS TE DOY POR HABER PERMITIDO QUE YO CONCLUYA CON TODA
FELICIDAD EL SEGUNDO AÑO DE MIS ESTUDIOS. CONCÉDEME SIEMPRE TU PROTECCIÓN, QUE
YO PROCURARÉ SER BUENO Y HUMILDE, Y SEGUIRÉ LOS CONSEJOS QUE ME DAN MIS PADRES
Y MAESTROS.
¡GRACIAS POR TU BONDAD, DIOS MÍO!
Al maestro. Los alumnos deben leer esta página lentamente y con
devoción.
Observación: Adviértase que toda esta lección va impresa con letras
mayúsculas, lo cual se usa, á veces, en algunos escritos de especial
importancia. (Figueira, 1904: 190).
Até aqui, os textos de Figueira insistem na
obediência, nas virtudes a desenvolver perante Deus, perante os professores,
pais, irmãos, etc. As indicações dadas aos professores acerca de como devem as
crianças ler as leituras, os conceitos que os educadores devem explicar aos
escolares (“oração”, “virtude”, etc.) mostram sem dúvida alguns tópicos
textuais presentes na já citada série Mándevil. Contudo, a “moralização” de
origem católica, pode também ajustar-se ao igualitarismo da nação laica.
Na já citada lição chamada “Consejos”
deparamos com a seguinte instrução dada ao escolar: “Trata á todo el mundo con
respeto: á los pobres como á los ricos, á los blancos como a los negros.”
(Figueira, 1904: 188).
O quadro deste igualitarismo
fica fixado não obstante, ao conjunto de “conselhos” que também marcam a
obediência aos pais, aos professores, à pátria e a Deus:
Ama mucho a tus padres. Nunca les des el más leve motivo de
disgusto.(…) Respeta y quiere mucho á tus maestros; pues á ellos les deberás
gran parte de tu felicidad(…) Ama a tu patria y haz lo posible por su
prosperidad (…) Piensa á menudo en Dios, trabaja y pórtate bien: así merecerás
su protección. (Figueira, 1904:188).
Os textos de Figueira - produzidos depois da
reforma vareliana - conseguem conjugar aspirações da religião civil da nação
laica com “faíscas” católicas. A prática substitutiva da religião civil da
nação laica assume aqui uma espécie de coexistência com partes do corpus
católico.
Evidentemente, embora os livros de leitura de
Figueira não foram, como já indicamos, os únicos livros de leitura utilizados,
não estiveram isentos de difusão e importância. De
acordo com Bralich (1990): “Según
circular de la Dirección de Instrucción Primaria del 12 de junio de 1901, estos
libros fueron incluidos en la lista de 22 únicos libros a utilizarse en las
escuelas públicas” (Bralich,1990:13).
Convém porém, fazer uma observação importante:
os textos de leitura que contêm menções relativas ao catolicismo não fazem
nunca referência nem à Igreja Católica, nem às autoridades da mesma (por
exemplo: padres, freiras, monsenhores ou a figura do Papa). Tampouco há
referências de relevância a Jesus Cristo, à Virgem Maria, aos santos católicos
ou a milagres significativos para a tradição católica.
Voltando então aos livros de leitura de
Figueira, no livro “Un buen amigo”, deparamos com a lição 89 denominada “La
patria”. O texto citado é o seguinte:
Lección 89.
La Patria
Hemos de ser un pueblo unido y fuerte,
Una nación de amigos y hermanos;
(…)
É invocando de Dios el santo nombre,
Erguir la frente ante el poder del hombre. (Figueira,
1902:172)
Esta é uma das raras citações onde se fala da
Pátria e de Deus ao mesmo tempo. Teremos de esperar o próximo capítulo para ver
como os mesmos livros de Figueira carecem totalmente desta citação conjunta
(Deus e Pátria) ao falar, por exemplo,
de cidadão, nação, lei (Ver Figueira, 1900b:243; 1902:173)
Finalmente, para acabar com esta série de
Figueira, no livro “Trabajo”, deparamos novamente com a referida “moralização”:
Lección
124.(:240)
Oración.
Dios mío, á Vos elevo mi espíritu desde que la luz del día comienza á
alumbrar mis ojos.
Enseñadme á detestar todo cuanto sea malo; guiad mis pasos, para que
jamás me separe de la senda del bien.
Inspirad, Señor, en el trabajo mi alma, en la paciencia, en la
modestia, en la caridad y en todas las demás virtudes que tanto ennoblecen al
hombre.
Al maestro. Explicación de palabras: espíritu, detestar, senda,
inspirar, virtud, ennoblecer. (Figueira, 1900b: 240).
Mesmo assim, este livro termina, em sua lição 125, com a seguinte
reflexão: “Piensa a menudo en Dios y procura interpretar y obedecer las leyes
que gobiernan á la Naturaleza…” (Figueira,
1900b: 242).
Se os livros de leitura de Figueira
conseguem sobrepor-se ao laicismo
imperante - atenuando a sua prédica católica - a tal ponto de serem utilizados
até depois de 1909, perderam vigência, segundo Bralich (1990:33), em favor dos
textos de leitura de Abadie Zarrilli
nos anos 20 e 30, claramente laicos, nos livros de Emma Catalá de
Princivalle (1907, 1908a, 1908b) e de Vásquez Acevedo (1888, 1889a, 1889b,
1929), onde não encontraremos nenhuma referência ao Deus moralizador, nem às
religiões denominacionais.
Mesmo antes da proibição de 1909, as
raríssimas referências a Deus num ou noutro autor, referem a um Deus abstrato,
impossível de ser incluído em tal ou qual opção religiosa.
No “ Ejercicios progresivos de lectura,
ortología y ortografía. Libro sexto, quinto año” de Emma Catalá de Princivalle,
aparece citada a seguinte prece:
Lección 13.
A Dios.
Señor, en el murmullo lejano de los mares
Oí de tus palabras la augusta
majestad;
Oílas susurrando del monte en los pinares,
Y en la edad de los desiertos callada soledad.
Tu voz cruza en las brisas y el perfume leve
Que brota a los columpios de la silvestre flor,
Tu sombra entre las aguas magníficas se mueve,
Tu sombra, que es tan sólo la inmensidad del Señor!
Tú diste a la esperanza la forma de una fada,
Purísima inocencia le diste a la niñez;
Si existe sed al hombre, le diste la cascada,
Si hambre, en cada espiga la apasionada mies.
Y el niño y el anciano te llaman en su cuita,
Y acaso en sus delirios el réprobo también;
Te llaman los lamentos de la viudez proscrita,
Y el trovador que llora: Jehová, te dicen, ven.
Tu nombre en el espacio lo escriben los cometas
Con cifras misteriosas que el hombre no leyó;
Porque jamás supieron ni sabios ni poetas
El inmortal arcano que en ellos se encerró.
(Catalá de
Princivalle,1908b:73-74).
Dos livros de Vásquez Acevedo,
entre as raras lições que fazem referência a Deus, ou a religiões
denominacionais, encontra-se no seu “Libro cuarto de lectura”, a lição cujo
título é “La intolerancia religiosa”:
Lección 23.
La intolerancia religiosa.
Benjamín Franklin escribió contras las persecuciones religiosas la
siguiente parábola, en la que imitó con su ingenio ordinario el lenguaje de las
Sagradas Escrituras:
“Y sucedió, después de eso, que Abraham estaba sentado a la puerta de
su tienda, a la caída de la tarde.
Y he aquí que un hombre, agobiado por la edad, venía por el camino del
desierto, apoyado en su cayado.
Y Abraham se levantó de su asiento y, dirigiéndose hacia él , le dijo:
Entrad, os ruego, y lavaos los pies y descansad esta noche, y mañana os
levantaréis temprano para continuar vuestro camino.
(…)
Y cuando Abraham vió que el hombre no bendecía a Dios, le dijo: ¿Por
qué no adoráis al Dios Supremo, criador del cielo de la tierra?
Y el hombre respondió: Yo no adoro a vuestro Dios ni invoco su nombre,
porque me he hecho un dios propio que habita en mi casa y que me provee de todo
lo necesario.
Y el celo de Abraham se inflamó contra este hombre y se levantó y
arrojándose sobre él, lo echó al desierto a fuerza de golpes.
Y Dios llamó a Abraham y le dijo: Abraham, ¿dónde está el extranjero?
Y Abraham respondió: Señor, él no quería adoraros ni invocar vuestro
nombre, y por eso lo he arrojado al desierto, lejos de mí.
Y Dios dijo: ¿No lo he soportado yo durante trescientos noventa y ocho
años? ¿No lo he alimentado y vestido yo, a pesar de su rebelión contra mí? Y
tú, un pecador, ¡no has podido soportarlo una sola noche!. (Vásquez Acevedo, 1929:54-55).
Esta lição, chamada justamente “La
intolerancia religiosa”, cumpre de forma adequada com os princípios da religião
civil: a tolerância acompanha à pluralidade religiosa. O intolerante é aquele
que não aceita que outros possam ter crenças diferentes.
Se no capítulo 7 aprofundaremos os mitos e
representações da religião civil, aqui temos um dos seus supostos inscritos: a
tolerância acompanha a liberdade de opção religiosa na medida em que as crenças
religiosas (menos as da religião civil) constituem um tema que pertence à livre
opção. A fórmula corresponde, portanto, ao fato consumado da privatização das
“fidelidades secundárias” ou religiões denominacionais.
Também no mesmo texto de leitura encontramos
citada uma “Plegaria a Dios”, um Deus tão abstrato como o da já citada lição
pertencente a Emma Catalá de Princivalle (1908b:73-74).
Plegaria a Dios
¡Ser de inmensa bondad! ¡Dios todopoderoso!
A vos acudo, en mi dolor vehemente…
Extended vuestro brazo omnipotente,
Rasgad de la calumnia el velo odioso,
Y arrancad ese sello ignominoso
Con que el hombre manchar quiere mi frente.
(Vásquez
Acevedo, 1929:112-113).
6.3 Das maneiras de expulsar Deus
Temos percorrido as passagens e
imagens que fazem referência a Deus, ao corpus católico, aos preceitos morais
“moralizantes”. Neste percurso vimos que os textos de leitura que suportaram “o
embate” laico, fizeram-no por meio de um catolicismo atenuado, mais preocupado
com a moralização ou a “disciplinamento” do que com a configuração de uma
construção mítica.
As esporádicas representações que dão conta
de um Deus compatível com alguma denominação não conseguem conjugá-lo com
outras representações que dão conta do corpus mítico da nação emergente.
Esta afirmação acentua-se, evidentemente,
para aqueles textos que diretamente não fazem referência à religião de Estado
(catolicismo, até 1917), ou nos mostram pouquíssimas referências a um Deus
abstrato, fora de qualquer denominação.
Na conformação do cidadão, nos mitos e
representações da religião civil, a fé particular de cada um (privatização) não
tem muito o que aportar à nova
cimentação coletiva. Esperemos então, os mitos e as representações da religião
civil da nação, para encontrar essa cimentação em comum.